A PROSTITUTA, O LADRÃO, O VAMPIRO, O ESCRAVO E O MENDIGO
(Qual destas personas você usa mais para tentar ser
feliz?)
Como um dos principais efeitos psico-emocionais nocivos oriundos
dessa nossa cultura cristã-ocidental onde aprendemos que somos pecadores e
culpados de nascença, e que precisamos trabalhar muito para construir um ser
humano digno de ser aceito por Deus no Paraíso – e levando-se em conta o pesado
componente dificultador que é o fato de que há um Satanás “fungando no seu
cangote” a espreita constante para melar este projeto - está a “lógica” inconsciente
que infere que “se eu congenitamente não sou e nem tenho, preciso buscar isso
(o ser e o ter) fora de mim”.
Esta forma de pensar e de lidar com a vida é bastante
diferente, por exemplo, do pensamento oriental onde o ser humano, que muito ao
contrário de ser um nada e um ninguém congênito, é criado perfeito, eternamente
livre e pleno, padecendo apenas da ignorância temporária deste fato, devendo
portanto dedicar sua vida à despertar e realizar em si esta plenitude e
liberdade eterna sempre existente.
Muito diferente - em todos os sentidos - de se ter sido
criado pecador e culpado.
Isto desenvolveu na mente coletiva da nossa cultura uma
baixa auto-estima e uma menos-valia enorme – interessante apenas para quem
pretendia exercer dominação - onde o desconhecimento de que somos apenas
ignorantes da nossa natureza real, e não deficientes humanos e espirituais, fez
com que fossemos desesperadamente buscar fora de nós o que já tínhamos dentro e
não sabíamos.
Nosso amor, nosso poder pessoal, nossa alegria, nossa
coragem, nosso tesão de viver e criar, e todas as virtudes, qualidades e
potenciais existem inerentemente no ser humano desde sempre.
Ninguém pode roubar de nós nem nós podemos perder esse
patrimônio constitucional eterno que trazemos em nossa essência humana e
espiritual.
Mas podemos perfeitamente ignorar – e consequentemente
sub dimensionar e subutilizar - tudo isso, como de fato o temos feito há 2000
anos pelo menos, e passar a nos considerar e viver como seres que Deus não
terminou de fazer.
E aí vivemos como eunucos.
E precisamos sair por aí ancorando nossos buracos
internos, nossas carências, nossos medos e fragilidades aonde podemos.
Na família, no casamento, nas amizades, no trabalho, no
dinheiro, no poder, nos objetos.
Frequentemente recebemos no consultório pessoas que de
repente se sentem no vácuo, que tem seu “tapete puxado”, que ficam sem chão,
porque os filhos saíram de casa, ou porque se separaram ou enviuvaram, ou
porque foram demitidos ou se aposentaram, ou porque roubaram o seu carro, e por
aí vai.
Trabalho, objetos e relacionamentos tem função específica
na vida.
Trabalho é o veículo para expressarmos nosso potencial e
talentos, contribuir para o presente, deixar um legado para o futuro e receber
remuneração e reconhecimento por isso. Objetos são para nos servir como
ferramentas facilitadoras do viver. E relacionamentos são para reproduzir, trocar
afeto e vivências evolutivas.
Mas em nosso desespero existencial acabamos extrapolando
e ancorando nestas coisas e/ou pessoas muito mais do que seria saudável, e
porque não dizer, inteligente.
E é claro que jogar âncoras em terreno transitório e
impermanente, como é tudo isso aí que eu citei acima, é como “crônica de uma
morte anunciada”, ou seja, é estratégia fadada a naufragar assim que o objeto
do ancoramento desaparece do mapa por algum motivo.
E para jogar estas âncoras, ou em outras palavras, para
prender os meus tentáculos carentes e famintos, eu acabo me utilizando de certos
personagens míticos internos, de pequenos arquétipos funcionais que aqui, a
titulo de exercício e reflexão, eu chamei de “a prostituta, o ladrão, o
vampiro, o escravo e o mendigo”.
São atitudes estratégicas funcionais das quais vou lançar
mão para tentar obter e manter aquilo – segurança, auto-estima, amor próprio,
poder pessoal, alegria de viver, reconhecimento, respeito, etc. etc. - que não
aprendi que eu deveria era estar trabalhando para manifestar de dentro de mim.
É claro que o outro é importante. É fundamental.
Mas não para nos dar o que pensamos que não temos, ou nos
fazer sentir ser o que pensamos que não somos.
Nem os Seres de Luz como os Gurus, Anjos, Orixás, Devas
hindus ou os Santos, podem nos dar o que já temos ou nos tornar o que já somos.
A função destes Seres é nos ajudar a perceber e realizar
que já somos quem nós buscamos ser, e que já estamos no lugar para onde estamos
nos dirigindo.
E a função do outro - além de fazer o espelhamento necessário
para que eu, através da conexão e do relacionamento com ele, e através da
sincronicidade e da ressonância que fomentam e permeiam estas conexões e
relacionamentos, acesse material inconsciente ainda em sofrimento e limitação e
trabalhe as minhas questões pendentes - é trocar.
Trocar conhecimentos, vivências, experiências, afeto,
prazer, cumplicidade, solidariedade.
Manter aqueles cinco personagens - a prostituta, o
ladrão, o vampiro, o escravo e o mendigo - dá muito trabalho e demanda muita
energia. Inutilmente. Pois fatalmente acaba desembocando em mais decepção,
frustração e sofrimento, além de eventualmente prejudicar o(s) outro(s).
Melhor usar esta energia e este trabalho no sentido de se
abrir o olhar interno para acessar e liberar os potenciais, talentos e
capacidades inerentes ao ser humano.
Melhor usar o tempo, os neurônios e a energia bio-psico-emocional
instrumentalizando-se com ferramentas e estratégias que efetivamente materializem
e operacionalizem na vida prática a essência que vive aparentemente adormecida
ou sub utilizada em cada um de nós.
Como? Quer uma lista? Por exemplo: terapias (só aí já dá
uma lista enorme), meditação (também tem diversos tipos e estilos), Yoga (idem),
trabalhos xamânicos (idem), e por aí vai.
São com certeza ferramentas muito eficientes para
efetivarmos a nossa alforria dos grilhões que nós mesmos criamos.
Aí não precisaremos mais convocar aquele time dos cinco
personagens para trabalhar para nós.
ERNANI FORNARI
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