quinta-feira, 10 de agosto de 2017

REFLEXÕES SOBRE O UNIVERSO DO TERAPEUTA AUTÔNOMO

1.  Entendo perfeitamente que estejamos atravessando um momento de crise, e que a crise faz com que as pessoas tenham menos dinheiro ou, em o tendo, gastem menos com medo do futuro. Ok.
Só não entendo que pessoas contratem teu serviço, não te paguem, e pior, não te deem nenhuma satisfação.
Mas por outro lado, entendo perfeitamente o constrangimento e a vergonha por se ficar devendo, ok.
Penso que o constrangimento e a vergonha não deveriam ser maiores nem mais fortes que o bom caráter e a ética. Afinal ter, eventualmente, que dever, pode acontecer com qualquer um de nós.
Mais constrangedor ainda é o credor ter que ficar cobrando porque o devedor não se manifesta.
Quem deve, mesmo com motivos reais e justos, deveria procurar o credor e propor novas formas, mais viáveis, de pagamento ou no minimo dar alguma explicação e alguma desculpa, e não ficar se fingindo de morto.
Me parece que esta seria a forma mais honesta e bem educada de se proceder nestes casos.

2.  Vivemos uma cultura, um verdadeiro vício de pedir descontos.
Não sei se é uma característica tipicamente carioca, ou brasileira, ou latina, ou mesmo do ser humano em geral, mas o fato é que existe um sentimento coletivo de sempre ter que “se dar bem”, de “levar vantagem”, e isso não necessariamente tem a ver (e na maioria das vezes não tem) com falta de recursos.
Um fato, por exemplo, que várias vezes aconteceu com a gente, é a pessoa que nos procura profissionalmente, chora a maior miséria, desfia um imenso rol de dificuldades, pede desconto ou bolsa, a gente dá, e no meio do curso a pessoa troca de carro, ou no final do curso vai viajar prá Europa ou prá India... ou seja, economizou às nossas custas.
Eu acabei criando prá mim uma ética pessoal (e bem antes de ser terapeuta e professor) onde eu nunca peço desconto para serviços (terapia, médicos, cursos) e para alguns tipos de produtos (arte, artesanato). No máximo, se eu estiver realmente apertado, peço um prazo para pagar em mais vezes.
Acredito, como dinheiro é energia e valor (e valor tem a ver com auto-valor), pedir desconto – podendo pagar - traz nas entrelinhas a mensagem subliminar de que você acha que aquele trabalho não vale o que o profissional está cobrando. É uma forma inconsciente de desvalorizar o trabalho do outro.
É claro, que por outro lado, tem um exercício interessante de humildade, que é quando você realmente não tem dinheiro, quando você realmente não pode pagar, e quando você precisa realmente daquele serviço, aí você pede o desconto! Você não está querendo "se dar bem". E para ser bem justo e verdadeiro, devo salientar aqui que muita gente que nos procurou pedindo desconto se encaixava honestamente neste perfil.
Mas como disse, minha prática de 20 anos como terapeuta e 15 como professor, me mostram que estes casos são a minoria. A maioria é mesmo o velho vício de pedir desconto, de pechinchar.
Mas tudo isso é um grande aprendizado. Nós, terapeutas, não fazemos nosso trabalho só por dinheiro. E aí costumamos ser muito flexíveis, muito sensíveis e disponíveis para com as dificuldades de quem nos procura, muito abertos e tolerantes para negociar, e acabamos muitas vezes não tendo o retorno compatível à boa-fé e à confiança que depositamos no contrato que fazemos com clientes ou alunos que pedem descontos, prazos enormes ou formas pouco usuais de pagamento.
Durante quase uma década e meia tive essa mão aberta incondicional e irrestrita, atendendo aos pedidos de todos os que me procuraram (e nem precisavam insistir muito), e como se diz na gíria, “tomei algumas voltas” que infelizmente (ou felizmente) me obrigaram a passar a ser mais profissional, mais empresário, e colocar regras mais estritas.
Afinal somos autônomos, não temos carteira assinada, 13o., férias, FGTS, PIS, e assim como todos os mortais, pagamos impostos, contas, alimentação, etc. (e essa galera não nos dá descontos).
Continuo aberto para dar prazos, não trabalho mais com o sistema de depósito em conta que foi o sistema onde tive mais problemas (gente, fala sério, quem não tem cheque nem cartão, é porque tem problema com banco, e se tem problema com banco é porque não é bom pagador, na maior parte das vezes), e só dou desconto hoje para casos de excessão, para casos muito especiais.

3.  Além das vicissitudes que já citei nos outros dois tópicos, ainda temos que lidar com um estigma, que é o que eu chamaria de “obrigação da caridade compulsória”.
Infelizmente nossa área – das terapias transpessoais e energéticas – ainda é misturada, no imaginário coletivo, com religião e misticismo, e mais especificamente com as religiões do universo espírita (lembra do “fora da caridade não há salvação” e do “dai de graça o que de graça recebestes”?).
Esse estigma faz com que muitas pessoas ainda achem que, assim como acontece com os espíritas e umbandistas, nós também - porque trabalhamos com energia e sensitividade - deveríamos trabalhar de graça.
Com todo o respeito pelo Espiritismo – e eu super respeito e honro Kardec - discordo das duas máximas espíritas que citei acima.
Em primeiro lugar, na minha opinião, há salvação (seja lá como for que cada um entenda este conceito) em muitos outros caminhos, e não apenas através da caridade.
Em segundo lugar, não há nada que seja de graça no Universo.
Todo o Universo funciona, sistêmicamente, na base da troca, da auto-regulação, da lei harmônica e equilibrada do dar-e-receber.
Isso os orientais, por exemplo, já conhecem há milênios e a moderna Física Quântica está fartamente corroborando.
O que Kardec chamou de mediunidade não é um dom, é uma faculdade natural do ser humano (como aliás ele mesmo colocou).
Então ela não é alguma coisa que nos é dada de presente. Ela constitui uma parte, uma função sensorial do ser humano como qualquer um dos outros sentidos.
Se você hoje é portador de faculdades extra-sensoriais que se manifestam de forma explícita, não é porque Deus resolveu te brindar com um dom te recompensando porque você é uma pessoa muito bacana, mas porque provavelmente você já vem, há muitas vidas, “treinando” e despertando estas faculdades sensoriais através da sua jornada evolutiva, como deve ter acontecido com o Chico Xavier, por exemplo.
Isso aliás, vale prá qualquer talento. Ou você acha que a genialidade de um Van Gogh ou de um Mozart foi um presente que Deus resolveu dar prá eles porque eles eram uns caras muito legais?
Não estou dizendo, claro, que os espíritas e os umbandistas devam passar a cobrar pelo seu trabalho. Afinal a maior parte dos trabalhos feitos nestes grupos são realizados por seres de outras dimensões, que também estão em processo evolutivo, e que não se beneficiariam do dinheiro ganho. Ok. E também reconheço que a caridade é uma coisa muito importante e que deve ser sempre praticada.
Estou falando aqui, que terapias sensitivas e transpessoais são uma outra coisa, e que se encaixam em uma outra situação bem diferente.
Gastamos muito dinheiro com cursos e livros, gastamos muito tempo e neurônios estudando e praticando para podermos fazer um bom trabalho.
Ser terapeuta holístico não é nosso hobby, não é um trabalho caritativo voluntario que fazemos nas horas vagas (e quando já temos a nossa vida financeira equacionada).
E nem, por sermos terapeutas sensitivos, somos seres super evoluídos quase iluminados que estão muito acima da média humana, e que porisso poderíamos prescindir do dinheiro.
Somos profissionais, como quaisquer outros, que vivem do seu ofício e que pagam contas e impostos como qualquer mortal.
Por outro lado, nem todo terapeuta holístico é necessariamente religioso, místico ou esotérico. Por exemplo, eu pessoalmente não sou. Me considero genéricamente um espiritualista (ecumênico, eclético e universalista), mas estou muito mais prá Física Quântica do que para o misticismo.
E confesso que é um saco ter toda hora que ficar me deparando com criticas e cobranças (e às vezes até com ofensas) como se fossemos todos um bando de charlatões mercenários que só pensam em ficar ricos exercendo a nossa picaretagem e enganando as pessoas que sofrem e que nos procuram.